Em quase
dois meses, CPI do Cachoeira ainda não foi capaz de produzir nenhum fato
relevante, perdida na briga de torcidas entre o PT e o PSDB. Parlamentares
temem que a investigação do esquema do bicheiro acabe se perdendo
Falta de
objetividade e disputa política intensa comprometem o trabalho da CPI que, após
quase dois meses, ainda não disse a que veio
Até a
última sessão, a CPI do Cachoeira já tinha aprovado 365 requerimentos, quebrado
57 sigilos e convocado 18 pessoas convocadas, entre elas os governadores de
Goiás, Marconi Perillo (PSDB), e do Distrito Federal, Agnelo Queiroz (PT).
Apesar disso, não há uma informação relevante sequer sobre o esquema do
bicheiro goiano que tenha surgido do trabalho dos deputados e senadores que
compõem a CPI. Nos quase dois meses de trabalho, as imagens mais emblemáticas
da comissão de inquérito são as sessões de silêncio de Cachoeira e outros
envolvidos ou a disputa das torcidas tucanas e petistas nos depoimentos de
Perillo e Agnelo.
“Não
estamos indo a lugar nenhum”, constata o senador Randolfe Rodrigues (Psol-AP).
“A CPI está sem rumo e com medo de avançar”, completa. “O PT protege os seus, o
PSDB protege os seus, e o PMDB não faz nada”, resume o senador Pedro Simon
(PMDB-RS). É uma situação que preocupa os integrantes da CPI mais
independentes, que já começam a temer que a CPI do Cachoeira passe para a
história como um dos episódios mais vexaminosos da história do Congresso
Nacional.
“Tá na
hora de trabalhar”
Ex-presidente
da CPI dos Correios, em 2005, que investigou o mensalão e cujos trabalhos são a
base inicial do processo que resultou no processo que será julgado ainda este
ano no Supremo Tribunal Federal, o senador Delcídio Amaral (PT-MS), espanta-se
com o fato de, até agora, a CPI do Cachoeira não ter requisitado auxiliares do
Ministério Público, da Polícia Federal, do Tribunal de Contas da União (TCU), e
da Controladoria Geral da União (CGU) para ajudar nos trabalhos. Não apenas na
CPI dos Correios, mas em todas as comissões de inquérito importantes, como a do
PC e a do Orçamento, procuradores, promotores, policiais e auditores foram
requisitados para auxiliar na investigação e na análise dos documentos.
“Tá na
hora da CPI trazer gente pra trabalhar na investigação. Leia-se MPF, TCU, CGU,
PF”, disse Delcídio, que, desta vez, é suplente da CPI do Cachoeira. Sem o
auxílio dos profissionais desses órgãos, os deputados e senadores simplesmente
não conseguem analisar as centenas de volumes de documentos das Operações Vegas
e Monte Carlo, da Polícia Federal, que requisitaram, além dos demais documentos
que logo começarão a produzir, com as quebras de sigilo pedidas.
Para
complicar a situação, o presidente da CPI, Vital do Rêgo (PMDB-PB), criou uma
rotina para o acesso aos documentos que tem recebido críticas generalizadas.
Primeiro, os parlamentares reclamaram que não havia estrutura na sala onde os
documentos ficam armazenados. No início, havia apenas um computador para ser
usado. Vital colocou depois outras máquinas à disposição, mas eles ainda são
apenas cinco. E eles ainda requerem o uso de senha para sua utilização.
Como se
não bastasse, ainda há documentos produzidos pela Polícia Federal que nem
chegaram à CPI. Até hoje, a comissão não teve acesso à integra das conversas
grampeadas durante as operações. A comissão não é capaz sequer de dizer se o
que possui corresponde ao que já foi vazado a diversos sites, publicações
e jornalistas. “Nós queremos ter acesso à totalidade dos áudios”, reclama o
relator da CPI, deputado Odair Cunha (PT-MG).
Na
quarta-feira (13), Odair encontrou-se com o ministro do Supremo Tribunal
Federal (STF) Ricardo Lewandowski, relator do inquérito do senador Demóstenes
Torres (sem partido-GO) na mais alta corte do país, justamente para fazer esse
pedido.
Controle
governista
O que
mais irrita os independentes é a sensação de que os parlamentares governistas,
nos esforços que fazem para manter o controle da CPI, atuam mais para evitar e
adiar investigações do que para orientar a apuração.
Uma
proposta para agradar governo e oposição foi feita pelo deputado Miro Teixeira
(PDT-RJ). O requerimento de convocação dos dois seria aprovado, mas a data das
oitivas seria marcada posteriormente pelo relator da comissão, deputado Odair
Cunha (PT-MG).
Porém,
nem assim os governistas cederam. “Nós precisamos das informações. Ou
então os depoentes virão aqui e não terão nada a acrescentar”, disse a senadora
Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), como se já não fosse exatamente isso o que até
agora está acontecendo na maioria do tempo. A comunista acrescentou que os
requerimentos não foram rejeitados, apenas sobrestados, “podendo ser votados a
qualquer momento”.
A manobra
de deixar os requerimentos sem votação é a forma que os governistas encontraram
para evitar convocações indesejáveis. Cavendish conseguiu transformar a Delta
de uma pequena empresa familiar na principal construtora do Programa de
Aceleração do Crescimento (PAC). Já Pagot ensaia ser uma testemunha-chave na
investigação caso se queira que ela vá a algum lugar. Ele afirmou que diz que
caiu do Dnit pela ação de Cachoeira, e está disposto a contar, caso seja
convocado, como atuam os esquemas dos corruptores no setor rodoviário, que
administrou.
Com a
decisão de manter o depoimento de Pagot na geladeira, o deputado Miro Teixeira
(PDT-RJ), um dos independentes, articula mesmo levá-lo a depor em alguma outra
instância do Congresso para gerar um fato que a CPI, em seguida, não mais
poderia ignorar. É uma estratégia que foi apelidada de “CPIdoB”.
“Tropa de
cheque”
Nas
críticas que fez às estratégias para adiar as investigações e depoimentos, Miro
chegou a provocar estremecimentos no Congresso. Num trocadilho com a “tropa de
choque”, que na CPI do PC defendia o ex-presidente e hoje senador Fernando
Collor (PTB-AL), Miro disse que agora há “uma tropa de cheque” ocupada em
defender a Delta na CPI do Cachoeira. Um trocadilho forte, porque pressupõe um
interesse pecuniário na atuação.
“Dizer
que existe uma ‘tropa de cheque’ é uma irresponsabilidade! Tenta colocar em
suspeição deputados e senadores. Essa CPI tem responsabilidade”, reagiu o líder
do PT na Câmara, Jilmar Tatto (SP).
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