O Estado
de S.Paulo
Os
distraídos decerto não se deram conta, mas a República correu grave risco na
madrugada da quinta-feira. Pelo menos é o que se poderia deduzir dos
estridentes pronunciamentos com que o vice-presidente Michel Temer e o seu
companheiro de caciquia no PMDB, o presidente do Senado Renan Calheiros,
reagiram a um obscuro episódio ocorrido a altas horas no aeroporto maranhense
de Imperatriz, a cerca de 500 quilômetros da capital São Luís. Ao que parece,
uma equipe da Polícia Federal (PF), mobilizada a partir de uma suposta denúncia
anônima e chefiada pelo delegado regional do órgão, invadiu um avião de
campanha do senador Edison Lobão Filho, candidato ao governo do Estado – pelo
PMDB, claro.
Alegadamente
de armas em punho, os federais revistaram o aparelho, os carros e a bagagem da
comitiva do suplente de senador que exerce o mandato desde que seu pai, o
titular da cadeira, se licenciou para ocupar o Ministério de Minas e Energia. A
propósito, ao que se divulgou semanas atrás, o nome do genitor teria sido
citado pelo ex-diretor de abastecimento da Petrobrás Paulo Roberto Costa entre
os envolvidos no festival de corrupção na área da estatal que o delator
comandava. Desde então, o ministro não tem sido visto em Brasília. Em
Imperatriz, os federais estariam atrás de dinheiro de caixa 2 da candidatura de
Lobão Filho. A diligência deu em nada e os policiais se retiraram, deixando
como encontraram os bens vistoriados.
Nada nem
remotamente parecido, portanto, com os devastadores resultados de outra
incursão da PF em terreno politicamente minado no Maranhão. Em 1.º de abril de
2002, agentes do órgão acharam e apreenderam R$ 1,34 milhão em dinheiro vivo no
escritório do marido e sócio da então governadora Roseana Sarney, filha do
oligarca nascido José Ribamar Ferreira de Araújo Costa. O escândalo acabou com
as pretensões de Roseana de conquistar a cadeira que já foi do pai, no Palácio
do Planalto. Mas não impediu que no mesmo ano ela se elegesse senadora,
juntamente com uma cria da família, Edison Lobão. O clã serviu fielmente ao
regime militar, mas para o PT de Lula e de Dilma isso são águas passadas.
O ainda
senador Sarney, de 84 anos, e a atual governadora Roseana, 61, não participarão
mais de disputas eleitorais. O futuro do soba, de qualquer forma, estará em
causa no pleito próximo. Ele corre o risco de sofrer uma rara derrota se as
urnas confirmarem a dianteira do adversário histórico do clã, o ex-presidente
da Embratur e ex-deputado federal Flávio Dino, do PC do B. Ele aparece nas
pesquisas com 42% de intenções de voto ante 30% de Lobão Filho. Daí, quem sabe,
o teor desproporcional ao incidente das notas emitidas por Temer e Renan sobre
o que teria sido a instrumentalização de forças policiais para “atingir
candidaturas legitimamente constituídas”, no dizer do vice-presidente,
como se a legitimidade das aspirações de Lobão Filho estivesse em dúvida.
De seu
lado, o titular do Senado advertiu que as instituições não podem
“descambar para a exploração político-partidária”. De fato, não
podem, mas, pelo seu retrospecto amplamente conhecido, Renan Calheiros está
longe de ser a figura pública mais credenciada a invocar esse princípio. A
indignação ostentada por ambos em face de uma ocorrência de dimensões afinal
restritas – embora, ainda assim, precise ser plenamente esclarecida, como
promete o Ministério da Justiça – contrasta com a indiferença dos aliados e
agregados do clã Sarney diante da baixaria cometida contra o oposicionista
Flávio Dino, numa tentativa, que se revelaria aloprada, de favorecer a
candidatura de Lobão Filho, mediante falso testemunho.
Um
presidiário do notório complexo penal de Pedrinhas, em São Luís, revelou que
foi induzido por duas autoridades do setor, com a promessa de receber uma paga
e regalias na cadeia, a gravar um vídeo acusando o candidato do PC do B de
ligações com o crime organizado. Os maranhenses não merecem o que a oligarquia
Sarney faz há décadas do Estado, enquanto os priva do acesso a serviços públicos
minimamente aceitáveis. O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do Maranhão é
o segundo pior do País. É a obra de um sistema de poder.
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