O professor Marco Villa tem mostrado expertise em assuntos maranhenses.
No último dia de Natal publicou, no jornal “O Globo”, um artigo que
elucida, com muita propriedade, algumas das mazelas atuais do Maranhão.
Dificuldades que se agravaram desde que os ministros do TSE, em seção
controvertida do dia 17 abril de 2009, depuseram um governador eleito
por votação popular expressiva. E ainda colocaram no seu lugar quem
havia perdido o pleito. Aquela decisão colabora para a atual situação de
estado mais carente. Posição que o Maranhão havia deixado em 2005, e
manteve até o ultimo ano (2008) do Governo que foi apeado.
Os
brasileiros talvez desconheçam, mas o Maranhão é, provavelmente, o
estado com a maior vocação agrícola do Brasil. Nas suas fronteiras se
encontram quase todos os biomas brasileiros. Amazônia, Cerrados,
Pantanal, Litoral e Sertão. Há uma Bacia hidrográfica em que prevalecem
rios caudalosos e perenes. Ainda que, pelo menos quinze municípios onde
sobrevivem aproximadamente um milhão de maranhenses, tenham
características técnicas de semiárido, que o governo federal insiste em
desconhecer, no restante do estado as chuvas, em geral, se distribuem
com normalidade. A relação chuva que cai e evaporação do solo e
transpiração das plantas (balanço hídrico), costuma não ser
problemática. Os solos predominantes no estado não são dos melhores, mas
são agricultáveis e, com tecnologia adequada, podem surpreender.
Talvez o setor em que o Maranhão tem alguma vantagem comparativa ou
competitiva, e chances de deslanchar, é o agrícola. Não obstante essa
evidencia o grupo que governou o estado entre 1995 e março de 2002 não
viu o menor problema de retirar, no inicio de 1998, a Secretaria de
Agricultura do primeiro escalão do organograma administrativo do estado,
colocando-a como penduricalho de uma “Gerência de Planejamento”. Uma
estrutura administrativa jamais experimentada por qualquer outro estado.
Não poderia ser outro o resultado. O Maranhão que, em 1982 produziu
3.584 gramas diárias per capita num área recorde de alimentos (arroz,
feijão, mandioca e milho), em 1998 chegou ao fundo do poço, produzindo
apenas 678 gramas diárias por pessoa. Em 2001 o Maranhão era recordista
negativo em todos os indicadores sociais e econômicos.
Em abril
de 2002, assumiu um governo alinhado à família dominante, mas que com
ela romperia em 2004. Uma das providencias daquele novo governo foi
acabar com as Gerências, resgatando as secretarias, dentre elas a de
Agricultura. O estado voltou a prestar assistência técnica aos
agricultores familiares, o que não podia fazer antes porque não tinha
gente qualificada nos seus quadros. Tanto que em 1999 o Maranhão teve a
menor captação de Pronaf. Em 2006, livre daquele grupo poderoso, chegou a
ter a segunda maior captação de Pronaf no Nordeste. A produção de
alimentos voltou a deslanchar.
As oposições ao grupo que domina o
estado há quase cinquenta anos, finalmente conseguiram coesão e
elegeram, em 2006, o governador que deu continuidade àquele breve
período de progressos no estado até ser apeado em 2009. Aqueles que
haviam deixado o estado com os piores indicadores em 2001, voltaram ao
poder em abril daquele ano.
Ato contínuo, o Maranhão entrou em
regressão. O PIB per capita, que crescera bastante entre 2003 e 2008,
entrou em declínio. Com efeito, entre 2002 e 2008 o PIB per capita
maranhense cresceu a uma taxa media anual de 21,2%. Tomando como
referencia o ano de 2008, último do governo apeado por decisão jurídica,
comparando com os resultados de 2010, o crescimento médio do PIB per
capita neste interstício foi de apenas 6,2% ao ano. Voltou a ser o menor
do Brasil em 2010 (R$ 6.888,60). Valor que equivalia a apenas 1,1
salário mínimo daquele ano, a 35% da média brasileira e a 72% da média
do Nordeste, a menor do Brasil. Em termos de poder de compra, o PIB per
capita maranhense de 2010 praticamente estagnou em valores de 2008.
Dos 217 municípios maranhenses, em apenas vinte e três (incluindo a
capital), o PIB médio é maior do que este valor. Nesses municípios vivem
1.710.286 pessoas (26%), para onde vão 56% das riquezas do estado. Nos
demais 194 municípios, onde sobrevivem 4.859.397 pessoas (74%), o PIB
por pessoa é menor do que a média estadual. Nesses lugares o valor do
PIB anual per capita é de apenas R$ 4.137,93 (sessenta por cento da
média estadual e 68% do salário mínimo). Nesses municípios que são os
mais agrícolas do estado, pois neles as populações rurais superam as
urbanas, a taxa de analfabetismo da população maior de quinze anos é de
25,6% e a escolaridade média é de apenas quatro anos (analfabetismo
funcional). Algo como 75% dessa população sobrevive em domicílios cuja
renda total de todos os seus membros está contida no intervalo de zero a
dois salários mínimos (0,3 salários mínimos por pessoa). Pobreza
absoluta.
Todos nós sabemos da influencia que o poderoso chefe do
clã maranhense exerce no governo federal nos últimos dez anos, ao ponto
de deter atualmente dois Ministérios sob sua influência. Isso, contudo,
não sensibilizou o presidente que ficou oito (8) anos no poder, nem a
que assumiu em 2010. O Maranhão continua sendo o “Patinho Feio” do País,
a despeito de ter proporcionado a maior votação proporcional para a
atual e para o Presidente anterior. Os brasileiros precisam conhecer o
Maranhão, um estado rico com população empobrecida, que é tratado como
capitania hereditária sob os olhares coniventes, complacentes e passivos
de quem governa o País. Até Quando?
*Professor associado na
Universidade Federal do Ceará. Autor do livro “Mapa da Exclusão Social
no Brasil: Radiografia de um País Assimetricamente Pobre”, já na
terceira edição.
Site: www.lemos.pro.br
E-mail: lemos@ufc.br.
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