FERNANDO MELLO
DE BRASÍLIA
ANDREZA MATAIS
ENVIADA ESPECIAL AO RIO
O ministro do Trabalho, Carlos Lupi (PDT), ocupou simultaneamente, por quase cinco anos, dois cargos de assessor parlamentar em órgãos públicos distintos, a Câmara dos Deputados, em Brasília, e a Câmara Municipal do Rio de Janeiro.
A “acumulação remunerada de cargos públicos” é proibida pela Constituição e pode levar a ações judiciais por improbidade administrativa e peculato, com cobrança da devolução dos recursos recebidos de maneira irregular.
Entre dezembro de 2000 e novembro de 2005, ao mesmo tempo em que era assessor-fantasma da liderança do PDT na Câmara dos Deputados em Brasília, como a Folha mostrou sábado, Lupi também ocupava o cargo de assessor de um vereador do seu partido na Câmara Municipal do Rio, a quase 1.200 km da capital.
Ambas as funções exigiam que ele estivesse, durante 40 horas semanais, nos locais de trabalho.
Em Brasília, a norma da Câmara dos Deputados dizia que o funcionário deveria ser “encontrado” na Casa.
No Rio, cada vereador tem o poder de decidir quais assessores devem ficar no gabinete. Sami Jorge, o ex-vereador que empregou Lupi, afirmou que o ministro “dava expediente todos os dias”.
Mas Jorge diz não se lembrar quais funções o ministro exercia no seu gabinete nem soube explicar como o ministro poderia trabalhar nas duas cidades ao mesmo tempo.
“Já faz algum tempo e eu confesso ao senhor que não tenho memória da função de todos os servidores do meu gabinete. Não sei o que fazia e por qual período”, disse.
TRAJETÓRIA
Lupi, que ficou no gabinete do vereador até novembro de 2005, é funcionário concursado da Prefeitura do Rio e, por esse motivo, foi cedido à Câmara com ônus, o que significa que o Executivo municipal continuou pagando seu salário. A prefeitura não informou seus ganhos.
Em Brasília, ele recebeu vencimentos que hoje representam R$ 12 mil.
Quando deixou a Câmara dos Deputados, em 2006, Lupi voltou à Câmara Municipal do Rio, no ano seguinte. Dessa vez para outro gabinete, do também pedetista Charbel Zaib, em um cargo cujo salário atual é de R$ 10 mil.
Pouco depois, foi exonerado para assumir o Ministério do Trabalho.
Lupi omite suas passagens como assessor nas suas biografias oficiais.
No período dessas atividades, ele exerceu funções partidárias, como vice e, desde 2004, presidente do PDT.
A Constituição prevê acumulação dos cargos apenas em hipóteses como professor e funcionários da saúde.
Desde 2003, o governo federal expulsou cem servidores que acumularam empregos públicos.
Se for constatado que o funcionário não trabalhou em um dos cargos, procuradores e promotores podem propor ações judiciais, em especial por improbidade administrativa e peculato (crime de apropriação ou desvio de dinheiro ou qualquer bem público).
“Em tese, se ficar claro que era impossível trabalhar nos dois empregos, é um caso de improbidade”, diz Alexandre Camanho, presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República.
“Cargos de confiança não são acumuláveis. A Constituição é bem restritiva”, diz Carlos Ari Sundfeld, presidente da Sociedade Brasileira de Direito Público.
No caso de Lupi, a proposição de uma ação dependeria da análise da prescrição de eventuais delitos.
Relacionado
0 Comentários