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Juízes lançam carta aberta ao Comitê da Crise Carcerária

Os juízes
Carlos Roberto Gomes de Oliveira Paula (foto), Auxiliar da 1.ª Vara de Execuções
Penais, e José dos Santos Costa, titular da 2.ª Vara da Infância e Juventude de
São Luís, protocolaram nesta sexta-feira (31), no Gabinete Civil da Governadora
Roseana Sarney, o documento intitulado “Carta Aberta ao Comitê da Crise
Carcerária”, por meio do qual alertam para a ineficácia, a curto prazo, das
medidas que foram anunciadas pelo Comitê para conter a violência, mortes e
fugas no sistema prisional de São Luís.

Os
magistrados mostram dados da Secretaria de Justiça e Administração
Penitenciária do ano de 2014, os quais confirmam o déficit de vagas no sistema
penitenciário. Na avaliação de Roberto de Paula e José Costa, o mutirão
carcerário em curso é válido e importante, mas não vai minimizar esse excedente.
Os dois
juízes afirmam no documento que a resolução do impasse deve ser pela prevenção
de novas mortes e chacinas, bem como pela minimização do desrespeito brutal aos
direitos humanos que vem ocorrendo no sistema carcerário. Eles elencam
sugestões para minimizar a crise, dentre as quais, destinar a Penitenciária
Feminina, com capacidade para 210 vagas, para presos do sexo masculino, pelo
prazo de seis meses.
Também
sugerem a realização de mutirão carcerário com a finalidade específica de apreciar
a substituição, sempre que possível, da prisão preventiva por “outras medidas
cautelares alternativas”, para, pelo menos, 150 presos provisórios; concluir
com urgência a reforma da Cadet, cuja capacidade é de 400 presos e abriga
atualmente 203, de forma que passe a atender mais 197 presos; criação imediata
da Vara das Garantias na Comarca da Ilha (antiga Central de Inquérito) para
análise e filtragem das prisões em flagrante; adaptar urgentemente as
carceragens das delegacias de polícia do interior, transformando-as em unidades
prisionais de ressocialização, sob gestão da Sejap e realizar imediatamente
concurso público para agentes e servidores do sistema penitenciário. 
Os
magistrados encerram o documento destacando que somente a adoção de medidas
urgentes para reduzir a superpopulação carcerária evitará mais violência, fugas
e mortes.
Abaixo,
segue a Carta na íntegra:
CARTA
ABERTA AO COMITÊ DA CRISE CARCERÁRIA
Senhores
Membros,
É
preocupante a eficácia e exequibilidade das medidas anunciadas pelo Comitê da
Crise Carcerária para conter a violência, mortes e fugas no sistema prisional
da capital a curto prazo.
Segundo
dados da Secretaria de Justiça e Administração Penitenciária – Sejap, de 2014,
a capacidade dos presídios masculinos da capital é para 1.897 vagas e hoje
tem-se, aproximadamente, 2.535 presos, sendo 1.464 provisórios e 1.071
definitivos, logo, uma população carcerária excedente ou déficit de 638 vagas.
No Estado, a população carcerária, inclusive feminina, é de 4.763 para 3.607
vagas, com déficit de 1.156 vagas.
Registre-se
que essa capacidade é superestimada, pois a alínea “b” do parágrafo único do
art. 88 da Lei de Execução Penal-LEP estabelece o espaço mínimo de seis metros
quadrados por preso. No Centro de Detenção Provisória, por exemplo, há 49
celas, cada uma com 13,40 metros quadrados e oito pedras que servem de cama, ou
seja, a capacidade estabelecida pela Sejap é para 410 detentos, enquanto pelo
número de “pedras” seria 392 e pelo critério legal, 109. Atualmente, 655 presos
ocupam esse espaço, 245 acima da capacidade estabelecida pela Sejap e 546 além
do que estabelece a LEP.
Para
superar a crise no sistema prisional, o Governo do Estado editou em 10 de
outubro de 2013 decreto de emergência, apresentando algumas propostas, dentre
as quais a construção e reforma de unidades prisionais. Três meses depois (em
janeiro deste ano) criou o Comitê de Gerenciamento da Crise, reafirmando essas
medidas e incluindo, dentre outras, a realização de mutirão carcerário.
Segundo o
governo estadual, serão investidos mais de R$ 131 milhões no reaparelhamento do
sistema penitenciário. Entre as medidas encaminhadas está a construção de um
presídio de segurança máxima em São Luís, com 150 vagas, reforma e ampliação
das unidades de Coroatá (150 vagas), Codó e Balsas (200 vagas em cada uma). Um
presídio em Imperatriz, com 250 vagas. O secretário da Sejap anunciou que em
seis meses, com essas e outras obras, irá zerar o déficit de vagas no sistema
prisional do Estado.
Essas
medidas são inexequíveis a curto prazo. A maior unidade prisional, que poderia
abrigar parte desse excedente, é a de Ressocialização de Imperatriz, com
capacidade para 250 presos, que se encontra com as obras paralisadas e
certamente não ficará pronta em menos de seis meses. Diga-se: para construção
de presídio não basta boa vontade, decreto ou sentença! O Plano de Emergência
de 180 dias, decretado em 10 de outubro do ano passado, também tinha essa
proposta de construções e reformas. Decorreram-se 120 dias e o que foi feito? Por
outro lado, a construção de presídios regionais está enfrentando a resistência
e a oposição local, como em Balsas. A experiência mostra que a população aceita
pequena unidade prisional para aqueles que cometam crimes em seu município.
O mutirão
carcerário em curso é válido e importante, mas não vai minimizar esse
excedente. É que a finalidade do atual mutirão cinge-se à apreciação da
legalidade das prisões e à tentativa de pacificação do ambiente carcerário, com
informações diretas aos detentos da realidade formal de sua prisão ou, quando
muito, se houver julgamento, convertê-los de “provisórios” em “definitivos”.
Registre-se
que em setembro de 2013 a Unidade de Monitoramento do Sistema Carcerário do
TJMA realizou mutirão de presos provisórios e definitivos no Estado e, nas
correições ordinárias deste ano, ocorridas durante o recesso judiciário, todos
os juízes da área criminal foram orientados a reexaminar a situação dos seus
presos, sem maior impacto na superação desse excedente. Tem sido também relevante
o trabalho da Defensoria Pública, do Ministério Público e da assistência
jurídica da Sejap no atendimento dos encarcerados.
Acrescente-se
que a motivação predominante da violência e mortes entre os detentos não é a
prisão ilegal. Percebe-se que é pela superlotação insuportável que ofende e
brutaliza o ser humano, submetendo-os às disputas de facções criminosas.
Por outro
lado, são presos em flagrante aproximadamente 15 pessoas por dia, sendo a
maioria das prisões convertida em preventivas e, raramente, são aplicadas
medidas cautelares alternativas.
Sem
resposta ao excesso de presos ou déficit de vagas (urgente criação de vagas ou
liberação de presos), teme-se que apenas a presença da Força Nacional e da
Polícia Militar seja suficiente para evitar mais mortes, fugas e desrespeito a
direitos humanos.
Constata-se,
portanto, um impasse: ou fica-se com o Estado Democrático de Direito,
observando-se a necessidade de humanização dos presídios e de prevenção urgente
de mais mortes e até de chacinas, quiçá de um “Carandiru”; ou fica-se com o
discurso fácil e demagógico de que “as mortes não passam de disputa de facções
e nada devemos fazer para prevenir”. Optar pela segunda alternativa fortalece a
possibilidade de intervenção, de impeachment ou federalização dos crimes contra
os direitos humanos no ambiente carcerário.
A
resolução do impasse deve ser pela prevenção de novas mortes e chacinas, bem
como pela minimização do desrespeito brutal a direitos humanos que vem
ocorrendo no sistema carcerário.
É nesse
sentido que, percebendo a impossibilidade de criação a curto prazo de vagas
para atender o contingente de 638 presos, se sugere a adoção das seguintes
medidas:
1)
Destinar a Penitenciária Feminina, com capacidade para 210 vagas, para presos
do sexo masculino, pelo prazo de seis meses;
2)
Converter as prisões definitivas das mulheres em “prisão domiciliar” e as
prisões provisórias em “recolhimento domiciliar” ou outra medida cautelar
alternativa, com a fiscalização pela Sejap, através do Núcleo de Monitoramento ao
Egresso-Numeg;
3)
Destinar a Casa de Albergado da Rua do Sol (CAAE) para as mulheres que
descumprirem as exigências da “prisão domiciliar” ou de “recolhimento
domiciliar” e para aquelas que vierem a ser presas provisoriamente, pelo prazo
de seis meses;
4)
Conceder aos 114 apenados em regime semiaberto, com saída diária para o
trabalho, da unidade prisional do Monte Castelo, com capacidade para 80 vagas,
o “recolhimento domiciliar”, com a fiscalização pela Sejap, através do Núcleo
de Monitoramento ao Egresso-Numeg;
5)
Realizar mutirão carcerário com a finalidade específica de apreciar a
substituição, sempre que possível, da prisão preventiva por “outras medidas
cautelares alternativas”, para, pelo menos, 150 presos provisórios;
6)
Concluir com urgência a reforma da Cadet, cuja capacidade é de 400 presos e
abriga atualmente 203, para atender mais 197 presos;
7) Criar
imediatamente a Vara das Garantias na Comarca da Ilha (antiga Central de
Inquérito) para análise e filtragem das prisões em flagrante;
8) Adaptar
urgentemente as carceragens das delegacias de polícia do interior,
transformando-as em unidades prisionais de ressocialização, sob gestão da
Sejap;
9)
Convocar imediatamente concurso público para agentes e servidores do sistema
penitenciário.
Somente a
adoção de medidas urgentes para reduzir a superpopulação carcerária evitará
mais violência, fugas e mortes.
São Luís,
31 de janeiro de 2014.
José dos
Santos Costa
Carlos
Roberto Gomes de Oliveira Paula
Juiz
Auxiliar da 1.ª Vara de Execuções Penais

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