Mais de 100 candidatos a vereador em
todo o país representarão os interesses do movimento LGBT. Em dois
municípios, haverá candidatos a prefeitos com orientação homossexual.
Defesa dos direitos humanos fundamenta propostas
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Leocret tentará o terceirto mandato em Salvador |
No interior de Minas Gerais, a transexual Nany Araújo disputa uma
vaga de vereadora na Câmara Municipal de Conceição das Alagoas. Apesar
do preconceito, ela resolveu encarar o eleitorado e mostrar suas
propostas – que, garante a candidata, vão além da pauta LGBT. Assim como
Nany, 108 candidatos assumidamente homossexuais disputarão o cargo de
vereador em todo o país. Em 21 estados brasileiros, as bandeiras do
arco-íris deverão tremular nos próximos dois meses. Este é o maior
índice de candidatos assumidamente gays de toda a história. Se for
eleita, Nany entrará para um grupo que já tem por dois mandatos Leo
Kret, vereadora pelo PR em Salvador já por dois mandatos, que este
tentará nova eleição.
No entanto, o número contabilizado pela Associação Brasileira de
Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT) ainda pode
aumentar. Segundo o presidente da entidade, Toni Reis, a associação
ainda procura outros candidatos. “Muitas pessoas não integram nenhuma
associação ou estão em cidades afastadas, mas também se assumem como
gays”, disse ao Congresso em Foco.
Segundo Toni, a lista de candidatos pode chegar a até 150 postulantes
ao cargo de vereador. “Os números já são excelentes e demonstram que há
uma diminuição do preconceito por parte da sociedade, mas mostra também
que a categoria está mais unida e fortalecida”, disse. O presidente da
ABGLT explica que a estratégia adotada é a mesma dos adversários: a
união em torno dos interesses comuns. “Muitas vezes vemos evangélico
contra evangélico, mas que se unem rapidamente quando querem protestar
contra os nossos direitos. Então, estamos nos unindo também contra esses
ataques. Queremos fazer uma discussão bastante aberta com a população”,
explicou.
Avanço social
Filiada ao PSDB, Nany acredita que a sociedade brasileira tem
evoluído na discussão sobre as liberdades individuais e que os
preconceitos contra homossexuais diminuíram. “Por isso temos tantos
candidatos este ano. Acho que é um reflexo do avanço social. Claro que
ainda existe muito preconceito e muita violência contra os LGBTs, mas
por outro lado, percebemos que os debates têm avançado”, disse ao Congresso em Foco.
Toni alerta, porém, que esse movimento da representação gay gera
também reações mais fortes de setores mais conservadores da sociedade.
“Estamos tendo mais reconhecimento, mais direitos. Então, isso faz com
que setores atrasados da sociedade voltem sua atenção para nós e ainda
despejem ódio e discursos homofóbicos”, disse Toni.
A meta da ABGLT é eleger entre 15 a 20 dos pleiteantes. Em 2008, oito
pessoas foram eleitas. Se o objetivo for atingido, haverá um aumento de
mais de 50% no índice de eleitos. Neste ano, 22 partidos congregam
candidatos gays, lésbicas, transexuais, travestis e bissexuais. Os
partidos de esquerda possuem mais candidatos. O PT lidera a lista com 22
candidatos. Em seguida, está o Psol, com 13. Mas partidos de direita
também ofereceram espaço à causa LGBT como o DEM, PSDB, PP, PR e PSDC.
Filiada ao PSDB, Nany acredita que a questão partidária não é
definitiva na candidatura. “Eu fui convidada pelo partido para concorrer
este ano. Ainda que seja considerado um partido conservador, a legenda
abre espaço para outros posicionamentos. Você tem que ter posição, tem
que ter postura”, disse.
Propostas
Apesar de defenderem os direitos dos homossexuais, os postulantes
deverão empunhar suas bandeiras sob um leque mais amplo: o dos direitos
humanos. “A ideia é que a campanha não seja corporativista, mas que
outros temas que também afetam nossa comunidade sejam amplamente
discutidos. Por isso, queremos apresentar uma plataforma ampla que visa à
melhoria da educação, da saúde e da segurança pública, por exemplo”,
explica Toni. Segundo ele, a ABGLT irá pautar junto a seus candidatos
ideias que defendam o princípio da igualdade.
Ele ressalta ainda que é importante que o eleitor conheça muito bem o
candidato para quem vai dar o seu voto. “Não adianta votar em uma
pessoa só porque ela é gay. O eleitor tem que conhecer a história do
candidato, e principalmente as suas propostas. Orientação sexual não é
pauta política. Não conhecemos todos os 109 candidatos”.
Dentre as iniciativas detacadas pela entidade, os eleitos deverão
priorizar o apoio a projetos de lei que proibam a discriminação e a
criminalização da homofobia. A entidade também reivindica mais
audiências públicas nas câmaras municipais para discutir questões
relativas aos homossexuais e mais homenagens a lideranças LGBT. A
entidade defende ainda maior fiscalização sobre recursos do orçamento
destinados à comunidade, além da busca por parcerias com outras
minorias.
A entidade recomenda que os estados e municípios adotem o “tripé da
cidadania” que engloba a criação de conselhos, planos e coordenações no
Executivo para fiscalizar as políticas públicas voltadas à promoção da
cidadania e dos direitos LGBT.
A ABGLT ainda defende que os eleitos ajudem a garantir no orçamento
do governo municipal recursos financeiros para ONGs LGBTs, além de
apresentar ou sancionar projetos de lei de garantia, defesa, promoção e
proteção dos direitos dos homossexuais. A entidade recomenda ainda o
veto a qualquer legislação que possa, propositadamente ou não, ferir os
direitos garantidos pela Constituição. “Queremos um estado laico, que
cumpra as decisões de acordo com os preceitos constitucionais”, explica
Toni Reis.
Dificuldade
Segundo Toni Reis, o principal adversário dos candidatos homossexuais é o
financiamento das campanhas. “Quase todos os nossos candidatos farão
campanha sem recursos. Não temos igrejas e nem empresas para ajudar a
arrecadar dinheiro. Não temos Deltas [referência a empresa de construção
Delta, envolvida no esquema do contraventor Carlinhos Cachoeira] da
vida que dão esse aporte financeiro”, disse. Segundo Toni, esta
dificuldade acaba fragilizando o movimento. “Nossos aliados dificilmente
estão ligados a grupos econômicos”.
Para Toni, a amplitude de legendas é propícia para pautar e discutir
politicamente os direitos humanos. “Uma pessoa que é LGBT pode pautar e
polemizar com os fundamentalistas. Quanto mais partidos, mais ideologias
estiverem unidas em torno deste tema, melhor”, disse Toni.
Nany concorda com o presidente da entidade. “Não podemos ter uma
única pauta. Como vereadora, eu vou trabalhar pela cidade, mas é claro
que vou tentar melhorar a condição de vida de pessoas como eu. Vou
trabalhar pela garantia de trabalho às transexuais, que sofrem muito
preconceito no mercado. Vou instruí-las e mostrar quais são seus
direitos. Quero uma sociedade justa para todo mundo”, contou.
Candidatos majoritários
Dentre todos os candidatos, apenas dois disputarão as eleições
majoritárias. Estreante nas disputas, o professor de história Renan
Palmeira, do Psol, tentará se eleger à prefeitura de João Pessoa, na
Paraíba. Gay assumido, para ele o maior desafio é vencer o preconceito.
“Náo levo só a bandeira LGBT. Levo uma pauta que possa dialogar com toda
a sociedade. Vou defender sim o direito de combate ao preconceito, vou
defender sim uma sociedade sem homofobia, mas também se machismo, sem
racismo, sem exploração”, disse.
Para ele, o maior desafio em sua campanha será dialogar com setores
mais conservadores.
“É um setor que não é tão grande, mas é expressivo
da sociedade. E eles têm uma visão dos LGBTs estereotipada. Nós estamos
tentando dialogar com eles”, explicou.
Além de Renan em João Pessoa, Vanessa Portugal disputará a prefeitura pelo PSTU, em Belo Horizonte.
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