Governo negocia emenda em MP para
permitir que o RDC, um novo regime de contratação menos complicado
criado para a Copa, seja usado também em obras do PAC, escolas, creches,
quadras esportivas e postos de saúde
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Deputado Jerônimo Goergen, relator da MP do governo |
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O governo federal quer ampliar o uso das licitações simplificadas, o
polêmico Regime Diferenciado de Contratação (RDC), para construir e
reformar escolas, creches, quadras, e postos de saúde, além de tocar as
grandes obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Para
tanto, pretende valer-se de um expediente que se tornou rotineiro e
igualmente polêmico: a inclusão de emendas em medidas provisórias com
assuntos inteiramente diversos do propósito original, os chamados
“contrabandos”.
Aprovado no ano passado e
questionado no Supremo Tribunal Federal
porque, para o Ministério Público, abre brechas para “graves desvios de
verbas”, o sistema de compras hoje é permitido apenas para serviços e
obras relacionados à Copa do Mundo de 2014 e às Olimpíadas de 2016. Ao
contrário da opinião do Ministério Público, o governo entende que o RDC
reduz o preço das obras em até 15% e, por isso, quer estendê-lo a outros
projetos além daqueles vinculados à Copa e aos Jogos Olímpicos.
A ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, entregou uma
emenda à Medida Provisória 556/11, cujo relator é o deputado Jerônimo
Goergen (PP-RS). O deputado disse ao
Congresso em Foco
que pretende acolher a permissão para mais obras usarem o RDC: “Isso tem
lógica”. A previsão de seu gabinete é votar a MP esta semana no
plenário da Câmara. Na sua proposta original, a medida provisória
relatada por Jerônimo Goergen passa longe de versar sobre licitação de
obras públicas. A sua ementa
trata de isenções de impostos para vários setores
da atividade econômica. Goergen, que brigou para manter e ampliar
isenções de impostos, especialmente para setores ligados à produção
agrícola, diz que boa parte de seus objetivos foi atingida na negociação
com o Palácio do Planalto.
O relator diz que não haverá “contrabando” na MP apesar de o assunto
obras não fazer parte da redação original, que tratava de tributos.
“Chequei isso e meu consultor designado confirmou que pode”, disse o
deputado ao site.
A reportagem tentou contato com assessores de Ideli na sexta-feira
(11) e no fim de semana, mas não conseguiu. Há dez dias, a ministra
disse à agência Radioweb que “há boas possibilidades de aprovar” a
inclusão do PAC no sistema de licitações simplificadas. “O RDC diminui o
tempo e diminui também o custo da obra, pelos lances mais baixos que as
empresas acabam dando na licitação”, disse Ideli à agência. “Isso vai
agilizar em muito as obras em todo o Brasil, o que é muito importante.”
Em pronunciamento na noite de domingo (13), no Dia das Mães, a
presidente Dilma Rousseff lembrou da construção de creches, parte do
programa Brasil Carinhoso, para retirar da pobreza crianças de 0 a 6
anos de idade. “Vamos construir novas creches e, especialmente, ampliar e
estimular convênios com entidades públicas e privadas”, afirmou a
presidente. Acelerar essas obras com o RDC facilitaria a execução do
programa anunciado.
Leilão às avessas
A razão pela qual o governo defende que o RDC baixa o custo das obras
é que ele permite que o governo feche uma grande obra, em todas as suas
etapas, com uma empresa só, evitando “jogo de empurra” entre os
fornecedores, e permite que os concorrentes façam lances para baixar os
preços oferecidos, numa espécie de leilão às avessas.
Mas os procuradores do Ministério Público, críticos do RDC, lembram
que, ao contrário do que exige a Lei de Licitações, a nova modalidade
não prevê a obrigatoriedade de um projeto básico para os empreendimentos
serem licitados. Esse projeto básico é que estabelece as condições
mínimas de uma obra, e é a partir dele que se torna possível fiscalizar
se a sua execução segue o que estava previsto inicialmente. Sem ele, as
ofertas das construtoras podem ser difíceis de comparar entre si.
“É
a partir [do objeto] que as propostas podem ser objetivamente
comparadas”, afirmou o procurador geral República, Roberto Gurgel.
Além disso, fica impossível fiscalizar o que realmente foi feito ou não.
Sem ele, a definição e comparação de preços pode ser arbitrária.
Licitação três vezes mais veloz
Ao contrário do Ministério Público, o governo entende que o RDC vai
beneficiar os cofres públicos. Uma apresentação do Ministério da Fazenda
a líderes no Congresso analisou seis obras em aeroportos administradas
pela Infraero e com uso do novo sistema. O documento diz que as
licitações ficaram três vezes mais rápidas. A duração caiu de 250 dias
em média para 80 dias.
O preço dos empreendimentos também caiu. “Nessa amostra, o desconto
médio obtido nas propostas vencedoras foi de 15%”, informou o documento
da Fazenda. “Em todos os casos houve redução de lances após as propostas
iniciais.”
De acordo com a Fazenda, nem todas as obras do PAC poderão usar o
RDC. Estão excluídas as obras antigas, aquelas em andamento. Ainda
assim, mais de 8 mil obras se beneficiariam do novo sistema. A
contratação integrada – que deixa a obra inteira na mão de uma única
construtora – só poderá ser usada em empreendimentos com valor superior a
R$ 37,5 milhões – cerca de 250 obras.
As obras menores, que não terão contratação integrada, são creches,
pré-escolas, postos de saúde, obras de saneamento básico, Unidades de
Pronto Atedimento (UPAs). Nessa conta, entrariam mais de 7.500
empreendimentos.
Entre as cerca de 250 grandes obras, que poderão usar a licitação
simplificada e mesmo a contratação integral, estão a Hidrovia
Tietê-Paraná, a adequação da BR-153 no Paraná, a duplicação da BR-381 em
Minas Gerais, a Ferrovia de Integração do Centro-oeste e o metrô de
Fortaleza (CE).
Repetição
Pelo texto da emenda enviada a Goergen pelo Palácio, o RDC poderá
servir para “serviços de engenharia no âmbito do sistema público de
ensino”, obras do PAC e em aeroportos a serem utilizados na Copa e nas
Olimpíadas em capitais distantes até 350 km das sedes das competições,
caso, por exemplo, de Goiânia. Mas, nesses casos, a emenda simplesmente
repete o que já está no inciso 3º do primeiro artigo da
lei do RDC.
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