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Calheiros no Senado, Alves na Câmara e o Congresso no lixo

Por Reinaldo Azevedo

Ezra
Pound dizia que os poetas são as antenas da raça. Entendo que os,
digamos, artistas do regime são, então, as antenas do regime. Não faz
muito tempo, o músico Wagner Tiso, comentando o lulo-petismo, se disse
preocupado com resultados, não com a ética. O ator Paulo Betti defendeu a
necessidade de se “enfiar a mão na merda” para governar. A era
lulo-petista viverá, em breve, dois capítulos que recendem à ética
bettiana e reafirmam o realismo tisiano. Quando Renan Calheiros e
Henrique Eduardo Alves, ambos do PMDB, se sagrarem, respectivamente,
presidentes do Senado e da Câmara, Betti e Tiso terão motivos para
comemorar. Antenas.

Abaixo, há
uma sequência de posts com uma pequena amostra da obra recente desses
dois patriotas, como se não bastasse a folha corrida de atos pregressos.
Para funções tão importantes da República, o PMDB pode não ter escalado
os seus melhores homens, mas certamente indicou os mais influentes,
aqueles que representam, por assim dizer, o sumo e a súmula moral do
partido.
Henrique
Eduardo Alves, na sua campanha eleitoral, percorre o país a bordo de um
jatinho emprestado por um colega de bancada, o deputado Newton Cardoso
(PMDB-MG), o famoso Newtão, ex-governador de Minas que encontrou tempo
para se tornar bilionário mesmo sendo político. “Ou por causa”, intuirão
os leitores mais desconfiados. Em tempo: Newtão não incluiu o avião
entre os seus bens na declaração entregue ao TSE porque diz que o
aparelho está arrendado. Certo. Ele tem dinheiro para comprar uma frota…
O aparelho é só o seu pecado com asas.
A
empreiteira para a qual Alves direcionou algumas de suas emendas é uma
casa de periferia guardada por um bode. E isso, meus caros, não é
metáfora nem trecho de alguma obra de realismo mágico, subgênero
literário que encontrou na América Latina ambiente propício ao pleno
florescimento. O surrealismo não precisa ser imaginado. Está nas coisas.
Há mesmo um bode na tal casa. Só não está lá a empreiteira que recebeu a
bufunfa. O dono da empresa era, até a semana passada, um seu assessor. O
homem achou melhor se demitir.
Os Renans,
o pai e o filho, que é deputado federal, não conseguem explicar a
questão quântica que envolve a família e a propriedade de algumas
rádios, que, a um só tempo, são e não são do clã. Tudo depende do modo
como se olhe a coisa e dos documentos que são consultados.
Em 2007,
Calheiros teve de renunciar à Presidência do Senado porque ficou claro
que uma empreiteira pagava a pensão de um filho que ele teve fora do
casamento. Homem ético, cuidadoso com as palavras, ao se referir ao
episódio e ao período em que a amante estava grávida, ele dizia sempre
“a gestante”, deixando claro que é um político de sangue-frio e que
consegue manter o devido distanciamento crítico entre a Presidência do
Congresso e as folias de alcova… Seus pares se negaram a cassar seu
mandato.
Menos de
seis anos depois, eis Calheiros, mais uma vez, como o primeiro da fila
na sucessão ao Senado, candidato a dar sequência à gestão de José
Sarney, o Nosferatu que confere ao PMDB o senso muito aguçado de
eternidade que tem o partido.
É evidente
que essa gente não chegou agora à política. Alves já foi da base de
apoio de FHC, e Renan chegou a ser ministro da Justiça na gestão tucana.
Os fatalistas, quem sabe convencidos por Betti e Tiso, dizem que o
“Presidencialismo de coalizão” obriga a essas coisas… É besteira. Já
tratei desse assunto em outras oportunidades e não vou entrar no mérito
agora. Volto ao ponto: os petistas não inventaram esses caras, mas
permitiram que alcançassem altitudes inéditas. Encontram no pragmatismo à
moda peemedebista o instrumento necessário à consolidação de sua
hegemonia.
Também em
nome do realismo, as oposições, em especial o PSDB, buscarão uma
composição com esses valentes, porque a resistência poderia lhes custar
não participar da mesa diretora das respectivas Casas. Seria esse um
risco a correr? Seria, sim, desde que houvesse alguma interlocução com a
sociedade e um discurso. Mas não há. Vai, uma vez mais, se enrolar no
administrativismo e articular um de seus muitos silêncios.
Quando
alguns vigaristas acusam uma parcela da imprensa de ser o verdadeiro
partido de oposição do país, não deixa de haver certa verdade no que
dizem. Oposição à safadeza, à sem-vergonhice e à sem-cerimônia com que a
política brasileira enfia a mão naquela metáfora de Paulo Betti.

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