“Estamos recompondo
o funcionamento da máquina pública que havia sido totalmente destruída no
último governo. A realidade é que pouquíssimos órgãos do mandato anterior
efetivamente funcionavam. Havia terceirizações injustificadas, funcionários
fantasmas, muita desorganização.”
Leandro Mazzini
As primeiras semanas de governo de
Flávio Dino no Maranhão tornaram-se uma sucessão de descobertas – de ‘novidades
negativas’ – com o pente fino em contratos e na gestão que herdou de Roseana
Sarney.
O governador herdou o Estado com R$
24 milhões em caixa, mas com R$ 600 milhões em restos a pagar e uma dívida de
meio bilhão acumulada de precatórios a quitar, não pagos desde 2012.
Com o cenário não favorável, entrou
na lista de governadores que incluíram os cortes drásticos de custeio nas
prioridades, embora garanta que o Estado terá verba para grandes investimentos,
em especial no tripé Saúde-Segurança-Educação, e em obras de infraestrutura.
Nesta entrevista à Coluna, Dino faz
uma radiografia da atual situação da gestão, como tem resolvido as questões
para evitar uma crise, e fala em ‘recomposição do serviço público’.
‘A realidade é que pouquíssimos
órgãos do mandato anterior efetivamente funcionavam. Havia terceirizações
injustificadas, funcionários fantasmas, muita desorganização’, revela.
Recentemente, numa
entrevista a uma revista, o senhor disse que expulsou uma quadrilha do
Maranhão. Ela atuava no governo?
Atuava muito fortemente em várias
áreas do governo. Tínhamos aqui uma total confusão entre interesses privados e
aplicação de recursos públicos, e uma cultura de descumprimento generalizado da
lei. E isso fez com que muitas denúncias se acumulassem nesses anos todos, e a
mais recente delas é exatamente a que envolve essa tenebrosa transação
intermediada por Alberto Youssef e que acabou preso em São Luís.
Este não é apenas um caso isolado. É
fruto de uma sequência de casos e este é o mais notório, mas é o sintoma, a
ponta do iceberg que encontramos e estamos progressivamente desmontando,
apurando, e vamos tomar as medidas legais cabíveis para que haja inclusive
ressarcimento ao erário quando for cabível.
A sua antecessora,
a ex-governadora Roseana Sarney, foi citada pela imprensa como uma das supostas
beneficiadas pelo esquema de Alberto Youssef, e agora o STJ remete para o TJ do
Maranhão o processo. Como o senhor vê este cenário?
Nós vamos tomar as medidas legais que
neste caso concreto indicam a propositura de ações judiciais. Por determinação
do STJ, está em absoluta coerência com aquilo que defendemos. Tudo tem que ser
apurado. A Justiça do Maranhão, tenho certeza, é capaz de fazê-lo, e nós vamos
ajudar naquilo que nos cabe. Seja fazendo as apurações administrativas – temos
uma secretaria de transparência e controle que foi criada para isto – e temos a
orientação dada de a polícia e a Procuradoria do Estado de não observarem
critérios partidários em nenhum momento. Ou seja, todos aqueles
independentemente da posição política, do partido, que tenham em algum momento,
na gestão de recursos públicos, infringido a lei, devem responder perante o
Poder Judiciário.
O nosso papel neste caso, pelo
sistema jurídico brasileiro, não é propriamente de punir, mas de solicitar, de
provocar, de ajudar a investigar, e isto está sendo feito.
O senhor assumiu o
governo, é o principal agente público do estado, há uma responsabilidade
financeira. Como o senhor pegou o governo, com ou sem caixa?
Recebemos um passivo crescente. A última
estimativa que fizemos era da ordem de R$ 1,3 bilhão , porque a cada semana nós
descobrimos novidades, débitos que não estavam contabilizados – novidades
negativas. Dívidas não declaradas.
Vou citar a mais recente delas:
depois da nossa vitória na eleição, o governo do Estado parou de pagar a conta
de energia de vários órgãos públicos.
O senhor acha que
isso foi armadilha?
Uma sabotagem, evidente. Não havia
justificativa fiscal, porque havia dinheiro em caixa, para deixar de pagar a
companhia de energia que é privada. Descobrimos que a companhia de águas do
Estado deve quase R$ 20 milhões para a companhia de energia que é privada.
Porque simplesmente a partir de outubro eles não pagaram. A própria companhia
de energia emitiu uma nota esclarecendo que desde outubro vinha cobrando e o
Estado parou de pagar. E isso não foi informado na transição.
E isso aconteceu em
outros órgãos?
Em tantos outros órgãos. A dívida
ultrapassa R$ 30 milhões. Apenas a maior é da companhia de águas.
Então a sua
antecessora o sabotou?
Claramente, sim, infelizmente houve
uma atitude pouco democrática. Primeiro não houve uma transição organizada e em
segundo lugar, houve essa conduta. De criar dificuldades, de criar embaraços
para o novo governo, e isso se retratou em outros débitos que ficaram, por
exemplo com prestadores de serviços. Na área de saúde nos pegamos dívidas
superiores a R$ 100 milhões.
O senhor tem ideia
de quanto tem em restos a pagar para fornecedores?
Restos a pagar chegam a quase R$ 600
milhões.
E o senhor tem esse
dinheiro no cofre?
Claro que não! Nós recebemos R$ 24
milhões em caixa. Os precatórios não eram pagos desde 2012. Muita gente não
entendeu na época e hoje eu tenho uma hipótese de que esses precatórios pararam
de ser pagos para criar um mercado de negociações.
Porque o Maranhão sempre manteve os
precatórios em dia, era uma marca do Estado, desde tempos imemoriais. De
repente, em 2012, sem nenhuma justificativa fiscal, parou de pagar precatórios.
Então só de precatórios são outros R$ 500 milhões. Mais dívidas que já pagamos
este mês com bancos internacionais, parcelas de empréstimos, e tudo isso gerou
uma sobrecarga imensa de despesas neste começo de governo, que estamos honrando
aquelas relativas ao nosso governo, pagando o que deve ser pago, fazendo auditorias
em relação a pagamentos e ao mesmo tempo diminuindo gastos perdulários,
abusivos, encontrados e assim sucessivamente.
O senhor está
fazendo auditoria sobre os precatórios?
Na verdade o que pedidos ao Tribunal
de Justiça oficialmente é que nós façamos um trabalho conjunto, de
identificação dos precatórios segundo a ordem cronológica, e que haja portanto
respeito aos parâmetros constitucionais legais dentro da disponibilidade fiscal
do Estado.
Estamos esclarecendo o montante que
vamos poder pagar em 2015 e vamos informar isso ao TJ para que pague segundo os
seus critérios. Nós não vamos interferir na fila. Quem vai definir o ritmo de
pagamento, quem vai receber e assim sucessivamente vai ser exclusivamente o
Tribunal
Houve auditorias em
secretarias? Na praça o que se fala é que o senhor deve olhar para a frente,
não para o passado. É uma provocação necessária?
Na verdade estamos preocupados com o
futuro. Queremos tomar as medidas que o nosso Estado precisa para melhorar a
vida do povo. Isso envolve inclusive cuidar de coisas do passado que têm
repercussão agora. Nós estamos revirando.
Que coisas do
passado?
Por exemplo, dívidas que não têm
razão de ser. Contratos que nós deveríamos honrar mas que não têm razão de
existir. Isso são coisas do passado, mas que têm repercussão aqui, agora e
amanhã. Então se eu dissesse pura e simplesmente que tudo aquilo que está no
passado não me diz respeito, eu estaria traindo o meu compromisso fundamental
de cuidar bem do patrimônio público.
Então nós estamos sim revendo
contratos, diminuindo contratos de terceirizações, e fazendo auditorias em
algumas áreas. Cito exemplo: na saúde, temos auditoria sendo realizada lá a
pedido do gestor, não fui eu quem mandei. E isso não é uma determinação de uma
espécie de santa inquisição, de acordo com o que os gestores considerem
necessário. E quem vai fazer a auditoria não são os que eu nomeei, são
servidores concursados do Estado, que inclusive foram nomeados por outros
governos.
E o senhor já tem
resultados preliminares?
Ainda não. Isso depende de cada caso,
depende da solicitação de cada secretário à auditoria. Mas acredito que a
partir de março os primeiros resultados já sejam publicados.
O senhor disse que pegou
o governo com R$ 24 milhões, é um privilegiado, porque alguns governadores
pegaram o Estado falido. A maioria diz que será um ano de muitos cortes. Os
seus cortes também incluem investimentos?
Sobretudo custeio. Gastos
perdulários. Desativamos alguns privilégios. Como uma casa de praia custeada
com dinheiro público. Cortamos cargos comissionados, deixamos de provê-los.
Exoneramos todos e renomeamos naquilo que era necessário. Por exemplo, a
Fundação da Memória Republicana, que cuida do patrimônio do senador José
Sarney, tinha 45 cargos; vamos deixar 15. Fizemos isso em outros órgãos.
E sobretudo estamos enfrentando
contratos de terceirizações. No Detran saímos de R$ 20 milhões para R$ 6
milhões. São estas reprogramações, sobretudo no custeio, que estão permitindo
que a gente faça outros gastos de custeio, porque ao mesmo tempo que fizemos
isso, garantimos também o início da principal obra do governo que é a
recomposição do serviço público. Vamos nomear mais policiais, e aumentamos os
salários dos professores.
Que outros
investimentos de impacto o senhor prevê para este ano?
Sobretudo estas questões atinentes à
recomposição do quadro do serviço público. Estamos fazendo um seletivo para
mais mil professores, prorrogamos os contratos de outros 4.495 professores
temporários. Estamos no processo de finalização de mil novos policiais
militares, chamamos novos 60 profissionais para a Polícia Civil e vamos fazer
um concurso para o sistema penitenciário.
Estamos recompondo o funcionamento da
máquina pública que havia sido totalmente destruída no último governo. A
realidade é que pouquíssimos órgãos do mandato anterior efetivamente
funcionavam. Havia terceirizações injustificadas, funcionários fantasmas, muita
desorganização.
Os vários problemas
do complexo penitenciário de Pedrinhas terminaram ou só saíram do noticiário?
Estamos progressivamente fazendo com
que eles sejam resolvidos, não resolvemos tudo.
Mas não se viu mais
rebelião..
Conseguimos encontrar um ponto de
equilíbrio. Primeiro lugar, recuperamos a autoridade do Estado sobre o sistema.
Quando chegamos, os presos por exemplo eram donos das chaves das suas próprias
celas em muitas unidades. Recuperamos recomposição de equipes, fornecemos
fardamentos aos presos, criação de rotinas, de procedimentos, fizemos movimentações
de presos visando diminuir o poder das facções.
Até aqui temos encontrado o caminho.
Conseguimos a prorrogação da presença da Força Nacional de Segurança , que tem
sido uma ajuda importante no sistema penitenciário. Temos hoje uma tendência declinante
de índices de criminalidade dentro e fora do sistema judiciário.
O que pode o
cidadão esperar do novo governo até o fim do ano?
As medidas mais importantes estão no
terreno da educação e da segurança pública. Vamos iniciar uma campanha de
alfabetização, já que temos o maior analfabetismo do Brasil.
O senhor conta com
quem para isso?
O trabalho local e vamos conhecer no
MEC as várias metodologias existentes para encontrar a mais adequada à
realidade maranhense. Vamos começar o processo de substituição das escolas de
palha e barro. Simultaneamente vamos lançar grandes obras mediante a
reprogramação do saldo do empréstimo do BNDES.
Reprogramamos as obras de modo a fazer intervenções
estruturantes no Maranhão. Vamos completar finalmente a ligação dos Lençóis
Maranhenses com o Delta do Parnaíba e o litoral do Ceará na chamada Rota das
Emoções.
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